Me causa estranheza as projeções de gestores para construção de megalópoles. Fosse eu, tal qual Billy Blanco, em “Não vou pra Brasília” (1957) Billy Blanco – Não vou pra Brasilia, contemporâneo de JK, certamente desconfiaria do projeto megalómano do político mineiro sobre a construção da nova Capital Federal.
A depender do “interesse” pessoal na empreitada e condição financeira, com certeza o liseu das classes C’s desses brasis, não acenaria com um segundo de otimismo ou voto pró. Pobre de verdade é um bicho desconfiado e, conhecendo a alma dos políticos, torna-se totalmente avesso a arroubos futuristas.
A primeira impressão ou antevisão que o pobre tem é de sua própria extinção. Vê-se periférico e excluído à medida que os arranha céus e os prodígios da arquitetura futuros erguem-se do chão. Ve-se formiga, minúsculo, dispensável, inseto a ser apisunhado.
Por sua vez, toda e qualquer façanha mega pressupõe exclusão. Ato que se materializa em ocupação predatória de espaço, relocação (ou expulsão sumária) dos nativos, distorção de seus modos de vida, desconsideração a suas concepções de mundo, tradições e cultura.
O projeto brasiliano deslocou populações, interferiu nas rotinas, transformou
capiaus em lambaios de obra, os candangou, exauri-os, sugou-lhes suor e sangue.
Sepultou-os alguns sob toneladas de cimento pátrio, como tão bem retrata o documentário de Vladimir Carvalho, “Conterrâneos Velhos de Guerra” (1990). Recrutou-os para “bucha de canhão”, como o faz o exército com jovens imberbes e reservistas em tempos de guerra.
No entanto, nunca ouvi falar de um monumento em louvor ao “candango desconhecido”. Se houver, orientem o cronista que tem ressalvas à Brasília. “Enquanto nós fomos vagão/ E fomos fogo/ fomos lenha e fornalha/ e o reverso da medalha/ é um futuro sem razão”, resumiu a canção popular da lavra de Alceu Valença e Carlos Fernando. Luiz Gonzaga – Plano Piloto
Imagine que essa era uma obra de integração nacional, patriótica, vanguardista, assim como um outro fiasco chamado Transamazônica. Imagine-se, porém, em menor escala. Pensemos em obras de dimensões locais, conduzida por ideias de progresso, dignidade e qualidade de vida e em que, certamente onde certamente a batuta seria empunhada por capitais forâneos e “virtuais”.
Não há hoje no Brasil um projeto avassalador de destaque nacionalmente. Mas sempre subexistem planos localizados (ou seriam ameaças?). Ouve-se falar, por exemplo, em projetos para ocupação das orlas inativas, nas cercanias das cidades. Há iniciativas em curso, inclusive, cujo objetivo imediato é acabar com o que ainda possa restar de mata atlântica, substituindo-as por resorts e parques aquáticos.
Pelo congresso – sempre em nome dos interesses do povo, SQN – circula, também, projeto de lei prevendo a cessão de nacos da orla para esses projetos. Projeto, por enquanto, mas uma ameaça ao conceito de praia para todos.
Contudo, não é difícil ver gestores com brilho nas bilas quando anunciam querer transformar suas cidades em Dubai, a maravilha árabe. Mataraca, cidade do litoral norte paraibano, dormiu um dia sonhando com uma intervenção quase celestial que transformaria o bucólico lugarejo numa portentosa city tecnológica, parecendo extraída de um filme de ficção científica.
Arranha-céus belíssimos, pavimentação espetacular, porto e até carros voadores a la Jetson’s foram evocados no prospecto. A cidade porém acordou com a certeza de que passou por seu território mais uns vendedores de ilusão, gênios da lampadinha do engodo.
O que realmente chamou atenção no episódio foi o volume das cifras envolvidas. Estratosféricas para dizer o mínimo. Volume superior, em vários algarismos, ao PIB do país. Mataraca seria alçada, com certeza, à condição de Dubai dos trópicos. Além do mais, um principado, um potento feito Singapura ou Mônaco. Já poderia, inclusive requerer a emancipação à país.
Poderia pleitear a independência, elevar-se aos céus, virar satélite inacessível onde nenhum mortal, a pé, chegaria, nem usaria Alma de Flores ou Rexona em spray. A população nativa seria aproveitada, claro, como mão de obra barata e atração turística exótica de valor referencial. Certamente não morariam mais em seu leito de criação, não teriam condições de manter-se ali e a perifa seria seu lugar de abrigo.
A Dubai de valorização e dignificação do elemento humano local, pleiteada pelo meu amigo Adeildo Vieira, por exemplo, não se criaria por ali.
Mas voltemos aos valores a empenhar para as proezas visionárias. A fictícia metamorfose de Mataraca demandava o aporte de bilhões. Então, para qualquer façanha, mesmo que imaginária, tem-se que pensar extravagante, superlativo. Sonhar com pòlos dubaicos é pensar em somas consideráveis. Pergunto-me: há capital circulante para isso?
A preço de hoje, claro que não. Mas não afirmamos ser projeto? Para projetos existem sempre e aqueles já concretizados nos sugerem respostas para as fontes possíveis. Do petróleo árabe, leia-se, ditadura e tirania; da máfia russa, subtenda-se crime cibernético, prostituição, pornografia, tráfico e exploração de mulheres; dos gigantões da informatica e da tecnologia; do baronato dos cassinos, falemos de máfias americanas e poderio dos clas conservadores.
E do bolso pátrio, nada? Tem. Corrupção, financiamento público oculto e manipulação dos cordéis dos poderes constituídos dizem por si. Se houver uma origem limpa para os valores empenhados, denunciem-se!!!!!
Edson de França, pessoense, é Jornalista, Cronista e Poeta.






