O funcionário público Jaccques Silva, marido da técnica em enfermagem Thaaysnara Silva, que morreu tragicamente num acidente na manhã da terça-feira, 16, em Teixeira, Região Metropolitana de Patos. encerrou o Diário da Saudade, que ele vinha escrevendo nas redes sociais, com muita repercussão.
O casal, que tem um menino de três anos (Levi), era muito unido, e a morte da esposa mexeu com os sentimentos do marido, que encontrou força na fé, na família, no filho e nos amigos. Nos seus textos ele lembra pequenas coisas da rotina do casal.
Veja abaixo as postagens que o marido fez intituladas “Diário da Saudade”:
Diário de Saudade: 1° dia
Dormir foi difícil, mas não precisei de remédios. Acordar de madrugada foi inevitável, ver fotos machuca muito, ouvir o celular dela despertar no horário que a gente acordava para ir trabalhar foi torturante, ainda mais sem o “bom dia meu amor”. Meu coração está orgulhoso de ter oferecido um velório digno e organizado como ela sempre gostava de ver e de ter conseguido cantar, tocar e falar mesmo estando despedaçado. Minha missão do dia é não ficar parado para não cair. Se me encontrar na rua chorando apenas me abrace.
Diário de Saudade: 2°dia
O dia foi tenso, mas consegui não ficar parado e não caí, Deus me deu a paz que eu precisava e os amigos não me deixaram só em nenhum instante. Foi doloroso mais necessário ajudar a retirar as roupas e pertences que a vestiam como uma princesa, sapatos que com carinho eu comprava sem pensar duas vezes só para ter a satisfação de vê-la sorrir, tudo o que escolhemos juntos sendo colocado em caixas e sacolas mas com o maravilhoso propósito de caridade, coisa que era comum em sua vida. Sorrir e comer ainda são coisas difíceis, mas consigo manter-me firme e sem desabar em choro para amparar minha sogra ainda em choque e responder as perguntas do meu pequeno, ele deitou na mesma cama que eu para assistir desenho depois de tomar banho de chuva, sorriu, me deu um abraço e caiu em sono profundo. Hoje é dia de olhar um pouco mais pra mim, inevitavelmente acordei muito cedo, preparei o mingau do meu pequeno, aparei a barba do jeito que ela gostava e a missão de hoje é sorrir.
Diário de Saudade: 3° dia
O verdadeiros amigos foram a rota para me fazer sorrir, mesmo que pouco, mas conseguiram, sei que está doendo neles também mas se esforçaram e não imaginam o quanto se tornaram importantes para mim. Levi viajou com a avó para passar o fim de semana, dei apoio por ser um consolo para ela. O dia foi tranquilo, mas comer ainda é difícil, pois as refeições em família foram algo sagrado para nós e não vê-la do meu lado à mesa me arranca o apetite. Embora me sentisse melhor, o cair da noite deu-me uma rasteira, pois foi meu primeiro início de Sábado sem ela desligando tudo e dizendo: “vamos fazer o culto?” e como doeu, mais uma vez os amigos me socorrem e convidam a caminhar pela cidade, o que me fez bem e trouxe o sono; dormi bem e madruguei novamente. A missão de hoje é ir a igreja para primeiro culto sem ela e aproveitar bem o Sábado, esse Dia de descanso que tanto fez bem a minha família.
Diário de Saudade: 4° dia
É hora de tirar o sofrimento do palco e da direção holofotes, então hoje é o último dia em que posto este diário, embora tenha sido uma forma que encontrei para desabafar e inevitavelmente ajudar a muitos, vejo que é hora do stop. O Sábado foi menos doloroso do que imaginava, cumpri a missão de ir à igreja e ainda toquei e cantei novamente, já me alimento melhor e consigo entrar em casa sozinho com mais tranquilidade. Vejo que todo esse sofrimento me revela muita coisa sobre tudo e todos, mas o melhor é descobrir que tudo o que eu vivi com minha esposa agora serve de exemplo a tantos outros, e volto pedir aos casais que se amem além das fotos, além das redes e que os homens não tenham medo de expressar em vida, pois no sofrimento do luto não existe “o machão”. Eu carrego a alegria de não ter nenhuma palavra presa na garganta e nenhum gesto que não tenha feito todos os dias para fazê-la sentir-se a princesa que ela era. Hoje me dispus a pregar e volto ao púlpito para levar a mensagem de esperança que ela tanto amava: A MORTE, RESSURREIÇÃO e VOLTA DE CRISTO, não sei como será pregar sem vê-la sentada nos bancos da igreja, mas eu vou, e vou com coração cheio de alegria em saber que é exatamente o que ela queria que eu fizesse. Independentemente de religião, se você leu esse post aqui sinta-se convidado a cultuar conosco hoje a noite, com ela aprendi a derrubar muros chamados religiões, tivemos o prazer de visitar igrejas de amigos e garanto que isso não destruiu nossa fé. O local é o mesmo do velório, na Igreja Adventista do Sétimo Dia, Rua Osmário Faustino. Nos encontramos às 19h00min. Um grande abraço e que Deus continue abençoando grandemente suas famílias.
Depois da grande repercussão , ele resolveu continuar com o diário por mais três dias:
Gente, estou muito feliz por saber que os Diários de Saudade têm sido tão úteis para mim quanto para muitos casais e famílias. Receber o carinho e os abraços na rua e ouvir pessoas me pedindo que continuasse a escrevê-los me convenceu a continuar pelo menos até o 7° dia, continuem com suas orações, todos os textos são resultado delas.
Diário de Saudade: 5° Dia
Acordar com o domingo muito atarefado fosse talvez uma forma de ocupar a mente e até que foi bem útil, mas ainda não dá para esquecer daquilo que era comum para nós. Minha rotina de domingo era ver uma mulher dedicada acordando cedo para lavar roupas de uma semana inteira e me atribuindo a tarefa de dar banho em nosso pequeno e sair com ele, embora muito ocupada, estimulava esse momento dos homens da casa. Não me saia da mente o nosso último domingo, que foi diferente, acampei no fim de semana e cheguei por volta das 09h, a encontrei mais cansada que o comum e com a queixa de que a cadelinha Maggie havia comido a tomada do tanquinho e precisou lavar tudo à mão, embora cansada pediu que eu consertasse e me beijou. Nesse 5° Dia precisei continuar sendo forte mesmo com o aperto no peito, meu pequeno estava voltando da viagem com a avó e mais uma vez tive que encarar a dura realidade de um pai viúvo, é difícil olhar a carinha e brincadeiras dele e não lembrar que há poucos dias estávamos juntos dando nossa “surra de cheiro em mamãe”; pude passear e ir ao mercado com ele ainda sob muitos olhares na rua, o dia seguiu e eu havia me dado a missão de voltar ao púlpito da igreja para pregar, e milagrosamente eu consegui não só pregar, mas também cantar e tocar, a pós culto precisava cumprir a promessa ao Levi de que o levaria ao parque de diversões, ele dormiu no finalzinho do culto e acordou cobrando o passeio, eu honrei meu compromisso, mas confesso que segurei o choro inúmeras vezes ao vê-lo sorrir para mim em cada brinquedo. O passeio termina e convencê-lo a sair dos brinquedos é uma batalha com choro, mas consegui driblar com algumas cócegas. Voltamos para a casa das avós, eles comeu, escovou os dentes e fui colocá-lo para dormir, mas é claro ele logo se ajoelhou e disse: “Vamos orar” e assim o fizemos, após a oração ele me pede para deitar junto e cobra alguma historinha, ele completava todas frases da historinha até que dormiu profundamente. Minha missão de hoje é infelizmente burocracias e visitar o local de trabalho e colegas da minha amada. Continuem orando por nós.
Diário de Saudade: 6° Dia
Tive o prazer de conhecer o local de trabalho da minha princesa, trilhei o percurso desconfortável que ela fazia todos os dias para cumprir muito bem o seu juramento de ” dedicar a vida profissional a serviço da humanidade, respeitando os direitos e a dignidade da pessoa humana.” Impossível não relembrar daquela que foi a nossa última segunda-feira juntos, nós acordamos e eu falei que não ia trabalhar e que ficaria em casa para resolver algumas coisas nossas. Ela me beijou, se despediu e iniciei o meu dia. Depois de cumprir algumas tarefas corri em casa para preparar a surpresa que ela mais gostava, limpei a casa toda para que quando ela chegasse pudesse descansar, e que alegria quando chegou e sentiu o cheiro de limpeza, logo me agradeceu e deitou ao meu lado na cama, Levi e eu completamos a festa com “a surra de cheiro em mamãe”. O dia seguiu e ela como de costume propôs para jantar algo que eu gostasse e dessa vez foi pizza, ela fez tudo muito carinho e chamou nossas mães, aquele foi nosso último jantar em família. Corremos contra o tempo para chegar à igreja no horário certo, disse que eu podia ir andando pois passaria na casa da sua mãe para irem juntas. Chegamos do culto, conversamos um bocado e resolvemos dormir, ela nunca deixava-nos dormir sem antes fazer o culto familiar, onde liamos a Bíblia infantil com nosso pequeno e cantávamos alguns louvores; naquele dia Levi cobrou: “mamãe, vamos fazer o culto” e por incrível que pareça foi a última página e a última historinha da bíblia e ilustrada dele. Como tirar isso da memória em um dia de saudade? Não foi fácil encarar o dia, mas já consigo me alimentar e sorrir mais com as melhores lembranças, Levi não faz perguntas, mas afirma, essas afirmações são dolorosas e o que tenho a fazer é concordar, respirar fundo e explicar tudo sorrindo, como quem tem esperança, e eu tenho, de vê-la novamente um dia.
Sobre o Diário de Saudade: Como prometido, amanhã é o 7° dia e a última postagem, alguns me pedem que escreva um livro, mas não é momento para se pensar nisso, agora é hora de viver e dedicar tempo a Levi, não sei se lá na frente escreverei esse livro, mas tenho plena consciência de que nossa história merece. Sei que através dos textos você criou um laço com nossa família, e uma certa preocupação, então não postarei mais textos no Facebook, mas pode me acompanhar no instagram @jacquessilva_ que lá farei postagens diárias da vida com meu pequeno e nossa superação. Imagens valem mais que palavras. Um grande abraço, Jacques Silva
Diário de Saudade: 7° Dia
Dia de lembrar nossa última despedida, pois essa foi uma terça angustiante. Andar com uma mochila nas costas cheia de documentos para resolução de burocracias bancárias era a última coisa que eu queria estar fazendo na vida, já que se passaram 08 dias desde aquela terça que parecia ser mais um dia comum, acordamos com os despertar do celular, mas ela sempre levantava primeiro, vestiu Levi para ir a escola e tomou rápido seu desdejum, me atribuiu as responsabilidades de sempre: “escove os dentes dele e calce os tênis”, levantou-se da mesa e insistiu que eu comesse, já que eu sempre saia sem comer, “amor, não saia sem comer, tem iogurte e torradas, coma as integrais se não vão estragar”, ela me deu o último beijo falou “te amo, até mais tarde” fechou a porta e saiu, quem poderia imaginar que seria a última vez? Fiz tudo que ela pediu, deixei Levi na escola e ao chegar no trabalho recebo a ligação sensata de uma amiga que usou bem as palavras ao dizer: “Jacques, aconteceu um acidente aqui na Pedra do Galo e parece que foi com Thaysnara”. Deixei pacientes gritando por mim e saí como um louco na esperança de ter sido apenas uma queda por descuido, mas me deparo com a pior cena da minha vida, ali meu mundo desaba e minhas pernas fraquejam em chamar pelo seu nome e não ouvi-la responder, nunca imaginei sentir tamanha dor, não havia mais nada que eu pudesse fazer, o amor da minha vida havia se despedido de mim pela última vez. Passo a refletir sobre a efemeridade da vida, nós como casal adotamos a filosofia de vida em que nada era mais importante que família, e dentro da igreja era nosso principal ministério e não trocávamos nosso tempo juntos por nada. Não conto as vezes em que eu viajava com volta marcada para o dia seguinte, mas corria para voltar na mesma noite para que ela não dormisse só; se você conheceu a gente na rua, sabe que 90% das vezes estávamos juntos, terças e quintas a noite eram dias de passear na praça, comprar balinhas e relembrar o começo do namoro, agora acompanhado de uma criaturinha, mas isso não impedia nada; Sábados a tarde eram marcados pelos passeios no mato e a noite pelos filmes, que ela mandava eu escolher mas na maioria das vezes a escolha era dela, e claro, tinha que ser romance. Eu andava até questionando, “amor, por que tu só escolhe esses filme de romance que alguém do casal morre”, ela apenas ria de mim. O problema é que na maioria desses filmes ninguém sabe como o que ficou sozinho termina o resto da vida. Dessa vez o romance foi na vida real e infelizmente eu descobrirei o que acontece com quem perde o amor. Amigos, a vida é um sopro e talvez você esteja perdendo o melhor dela por medo ou vergonha de amar, talvez ocupado demais com o trabalho ou presos ao maldito celular (vou deixar um vídeo para reflexão nos comentários), “nos tornamos graduados em nós mesmos, temos pós em solidão”. Esse foi o Último diário de Saudade, e que vocês principalmente homens, possam ter aprendido um pouco com a minha dor. Expressar amor não faz de ninguém menos homem, estou inteirinho aqui e realizado por ter amado como deveria. Ah! e não poderia deixar de dizer: o Deus que alguns esperavam que eu fosse negar em meio a dor, foi o mesmo que me sustentou até agora com transtorno de ansiedade sem precisar tomar nenhum comprimido nem chá para dormir. Que Ele abençoe grandemente a sua vida também.
Fim do Diário da Saudade:
O Diário de Saudade findou, e quão feliz estou por ter sido tão útil. Não imaginava a proporção que tudo isso tomaria e quantos corações seriam alcançados por aquilo que saia do meu coração; cada relato de pessoas se reuniam no trabalho para ler juntos, famílias reviram conceitos e mudaram rotina, que gratidão! Quem me conhece sabe que não sou um poço de simpatia e a timidez me faz isso, mas não me falta educação para tratar todos com carinho e atenção, meu trabalho revela isso. Não criem em mim a imagem de homem perfeito para não se decepcionar, mas me vejam com pobre de espírito, capaz de reconhecer qual necessitado é da graça e cuidado de Deus e que tem muito a aprender e ensinar.
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