Médico Cadmo Wanderley lançou o seu livro "Contemplando o Jabre", em 2015.
Compartilhe!
timthumb
“Contemplando o Jabre”, livro do doutor Cadmo Wanderley

Em Patos todo mundo conhece o médico Cadmo Wanderley, conhece o seu profissionalismo e o zelo com a Medicina. O que ninguém sabia é que ele, em silêncio, nos intervalos na sua clínica, entre um atendimento e outro, trabalhava um livro e, diga-se de passagem, uma obra robusta, de crônicas, com 456 páginas.

A obra “Contemplando o Jabre” foi inspirada em um trabalho começado, mas não terminado, pelo pai dele, cujo título tinha uma pequena variação: “E o Jabre nos contempla”.

Doutor Cadmo, ao dar tal título a sua obra, homenageou o pai e revelou nos seus textos uma Patos que não existe mais: a Patos do Monsenhor Manuel Vieira; a vida no Internato; falou da famosa Professorinha, tão decantada pelos mais velhos; falou da Vila Doracy, um casarão histórico onde ele morou quando criança, no bairro da Brasília, e que foi derrubado em setembro de 2013, gerando muita polêmica na cidade;  também aborda as antigas festa da Independência;  a época da pujança algodoeira em Patos, com a antiga SANBRA; conta pormenores da vida e da rigidez do internato; e discorre sobre a  Patos da sua adolescência e sonhos dourados.

03cb86ade96242275e8106b3eacec27f
Histórias envolvendo a Vila Doracy são contados no livro.

O livro tem sentimento (a doença do pai dele e o sofrimento deixaram marcas indeléveis no autor); tem humor (certa vez ele encontrou uma cobra coral no vaso sanitário e isso passou a amedrontá-lo sempre que ia ao banheiro); e tem conhecimento, pois dentro de um texto que fala de coisas casuais o doutor Cadmo encontra meios de citar um pensador, de divagar sobre algo, e cita nomes científicos de animais, discorre sobre invernos passados, e revela aos jovens de hoje, principalmente ao jovem que quer conhecer um pouco da história de Patos, como era a cidade e os costumes nos vibrantes anos 60, e consegue prender a imaginação do leitor.

Ele diz no livro que reconhece suas limitações em relação à Língua Portuguesa e a gramática, mas se isso for verdade, o leitor não se apercebe. A linguagem flui sem sobressaltos, fácil de entender, não é vulgar nem rebuscada. O escritor Cadmo Wanderley achou um meio termo que, de certa forma, impressiona, pois sendo um homem dado à linguagem técnica da Medicina, consegue uma boa fluência nas ideias que expõe.

É certo que o livro “Contemplando o Jabre” servirá como estudo para se entender uma época da história de Patos. Os livros costumam se agigantar à medida que o tempo passa e, sendo Patos uma cidade pouco voltada a si mesma, não é demais pensar que o doutor Cadmo, tendo intenção ou não disso, colaborou nos fornecendo informações sobre uma Patos muito badalada por quem vivenciou a época, mas cujos fatos constam mais da oralidade do que da escrita e, dessa forma, seu livro preencheu um espaço e há de ganhar uma dimensão ainda maior com o tempo

Ele já deixou claro que não pretende escrever outro livro, mas, com o que já publicou, deu a sua colaboração à cidade de Patos e registrou fatos curiosos envolvendo a sua família e personagens da nossa história.

O livro ainda pode ser encontrado em Patos. Está à venda na Distribuidora Nóbrega. É leitura aprazível e vale a pena.

Confira alguns trechos

“Não tivemos tempo de nos despedir. Foi tudo muito rápido. Minutos de inteiro desespero. Ele deitado no leito do quarto sufocado pelo tumor que lhe envolvia os brônquios e invadia seu esôfago. A maior angústia que jamais passei em toda a minha vida, porque não tinha nada a ser feito para aliviar a falta de ar que o sufocava. Não foi uma despedida normal. Existem despedidas que temos tempo de olhar para o nosso pai com ternura. Foi a pior de todas as despedidas. A despedida do meu pai foi triste. Muito triste. Deixou-me uma cicatriz que ainda não pude apagar; inassimilável.”

(Sobre a morte do pai)

“’Qual o problema do meu silêncio, que inquieta tantas pessoas?’, ele poderia pensar. Novamente, levei meu pensamento até o filósofo Morrie Schwartz, quando ele questionava por que o silêncio dele deixava as pessoas, que se encontravam ao seu redor, inquietas. Perguntava ele: ‘Porque as pessoas só se sentem bem se preencherem o ar com palavras?’ Sabedor disso, tinha momentos que eu somente observava o meu pai. Com um tranco dentro do peito. Morrer é um acontecimento triste. Ninguém tem dúvidas sobre isso. Mas, parece-me que viver infeliz é pior ainda.”

“Por falar no diálogo e no silêncio, existe um poema de Carlos Drummond de Andrade, onde ele diz que existem muitos diálogos: existe o diálogo com a amada, com o semelhante, com o diferente, com o oposto, com o adversário, com o surdo-mudo, com o possesso, com o irracional, com o vegetal, com o inominado; existe o diálogo consigo mesmo; com as estrelas; com os astros, com as noites, com as ideias, com o sonho, com o passado, com o futuro”.

“Um irmão meu (juiz de direito), caiu de uma motocicleta quando ia para o trabalho, entre as cidades de Patos e Malta. Naquela época o honorário de um juiz era tão baixo que meu irmão tinha somente o suficiente para comprar uma moto, hoje, a situação e bem diferente. E como. A Turma da Toga mudou de água barrenta e poluída para o vinho francês. (Crônica “Os Acidentes)

Folha Patoense – folhapatoense@gmail.com

Deixe seu comentário