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O edital de concurso para cadetes da Polícia Militar – aberto recentemente, com previsão de salário inicial de R$ 9,5 mil – estabelece que os candidatos deverão se submeter a um teste psicológico para avaliar se se encaixam no critério de masculinidade. O anexo 2 traz o perfil profissiográfico esperado para atuar na função e prevê que, na característica de masculinidade, a pessoa tenha capacidade de “não se impressionar com cenas violentas, suportar vulgaridades, não emocionar-se facilmente, tampouco demonstrar interesse em histórias românticas e de amor”.

A Aliança LGBTI e o Grupo Dignidade emitiram nota conjunta questionando os termos do edital, considerados discriminatórios e machistas, além de incompatíveis com atitude adequada de integrantes da Polícia Militar. As entidades também apelaram ao bom senso da primeira mulher a governar o Paraná, Cida Borghetti (PP), e da primeira mulher a comandar a PM do estado, coronel AudileneRosa de Paula Dias Rocha, para que o edital seja revogado.

O concurso para cadetes da PM é um dos mais concorridos do Paraná. Estão em disputa 16 vagas – sendo 14 gerais e 2 para afrodescendentes. É aberto para ambos os sexos, mas com uma cláusula que condiciona até a metade das vagas para as mulheres. Ou seja, no máximo, oito mulheres serão chamadas, mesmo que tenham notas superiores às dos homens. Se ocorrer o contrário, com homens conseguindo notas mais altas do que as mulheres, não há limitação de vagas para eles.

Análise

A reportagem buscou informações com o Conselho Regional de Psicologia do Paraná (CRP-PR) para esclarecer o conteúdo do edital. Mari Angela Calderari Oliveira, coordenadora de Comissão de Avaliação Psicológica, explica que alguns concursos públicos traçam um perfil profissiográfico, estabelecendo quais as características são essenciais para o bom desempenho da função. “Há uma descrição do cargo e quais as competências esperadas. Algumas são técnicas e outras são ligadas a aspectos cognitivos e afetivos”, conta.

A partir desse perfil estipulado, profissionais de Psicologia aplicam avaliações para averiguar se o candidato se encaixa. No caso do edital da PM, há, inclusive, complicações técnicas. “A gente não tem instrumento formal para avaliar o que é pedido no edital, com base em testes. Para concursos públicos, não é cabível que seja um critério subjetivo”, enfatiza.

Para além da parte técnica da aplicação do teste, Mari Angela também analisou o conteúdo do edital. “Aquilo que escrevem como masculinidade não tem a ver com o significado ou com o constructo do termo”, diz. Com vasta experiência na área, ela comenta que nunca tinha visto esse tipo de exigência em um concurso público. A psicóloga explica que ter um lado afetivo não impede, necessariamente, a ação do lado racional. Se o que se quer é que a pessoa tome decisões acertadas e que não se deixe levar pela emoção – e isso não tem relação com masculinidade”, resume.

Para a psicóloga, o edital concretiza ideias equivocadas do que espera de um policial. Mari Angela fez uma análise preliminar do edital e encontrou outras inconsistências. “Não dá para saber se um psicólogo participou da formulação. Algumas partes citam termos próprios dos manuais de avaliação, restritos aos psicólogos, mas outras partes não parecem ter qualquer tipo de critério profissional”, diz. Com base no que leu, ela diz acreditar que o edital deva ser modificado. O Conselho Regional de Psicologia deve se manifestar sobre o caso em breve.

Absurdo

Alexandre Salomão, presidente da comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil no Paraná (OAB-PR), considerou as exigências do edital como discriminatórias e preconceituosas. “É um dos negócios dos mais absurdos que já vi na vida”, afirma. O advogado salienta que a capacidade de não se impressionar com cenas violentas nada tem a ver com masculinidade. “O policial não deve ser insensível, brutalizado, indiferente ao sofrimento humano”, complementa.

Para Salomão, o edital deixa transparecer que a corporação busca candidatos com perfil de maior de possibilidade de práticas violentas. “A pessoa não tem que ser agressiva para ser policial, deve ter preparo, saber lidar com situações de estresse”, acrescenta. O representante da OAB declarou ainda que espera que o edital seja revisto, contemplando a expectativa de uma polícia que atue na garantia de direitos.

A assessoria de imprensa do governo do Paraná foi procurada pela reportagem e informou que a PM é que deve se manifestar sobre o caso. Questionada, a assessoria de imprensa da PM declarou que deve divulgar um posicionamento nesta segunda-feira (13).

tribunapr.com.br

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